sábado, 20 de novembro de 2010

Toda Novela Tem Final Feliz



Novela mexicana, claro!!
A (longa) história do rituximab.

Queridos, que fique bem claro: vou ter que contar a novela desde o comecinho. O Paulo Roberto, meu neurologista, como todos nós, seres humanos, estava passando por um momento muito difícil, com o pai grave no CTI, e que acabou por falecer logo depois. Trata-se de um médico admirável, que tenho elogiado desde o início do meu tratamento. Ele optou por continuar trabalhando, apesar da situação pela qual passava, e deu o máximo de si naquele momento.
Acompanhamo-nos há anos, ele me conhece como a palma da mão e a recíproca também pode ser verdadeira, visto que já o vi nervoso, stressado, preocupado, choroso, feliz, vitorioso, esperançoso, aliviado e o que mais possam imaginar...
Foi quem fez meu diagnóstico e quem suou a camisa com todas as dificuldades de uma evolução incomum para a miastenia gravis. Há seis anos converso com ele no mínimo semanalmente, e continuo confiando minha vida a ele.

Dito isto, vamos lá.
Em meados de novembro passado, enfim, depois de termos esgotado todas as possibilidades terapêuticas para um quadro refratário da miastenia, decidimo-nos, eu, o Paulo Roberto, o Rogério (meu clínico e meu primo querido), acompanhados de perto pela torcida da Hilda, minha hematologista, a tentar o tratamento com o rituximab.
Droga relativamente nova no mercado, aprovada pelo FDA, até então, para tratar o linfoma e a artrite reumatóide.
Há relatos de muitos casos bem sucedidos do uso desta substância em outras doenças auto-imunes, inclusive a que eu tenho; estes casos foram publicados na literatura médica e são bem conhecidos, mas não têm aquele estudo duplo-cego, etc, exigidos como comprovação científica, por se tratarem de casos relativamente raros, pois é indicada somente para os quadros que não respondem às terapias usuais, e estes são em número pequeno em relação aos diagnósticos realizados.
Depois de muita ponderação, colocando na balança as vantagens e os possíveis riscos de tal terapia, pediu-me o Paulo Roberto um tempinho para estudar melhor o medicamento e rever meu caso, até podê-lo prescrever com segurança.
Alertou-me o Rogério para o fato de que os planos de saúde vinham negando a cobertura deste tratamento com alguma freqüência, e que possivelmente teríamos que recorrer à justiça para consegui-lo.
Assim sendo, poucos dias antes do Natal pedi ao meu neuro que fizesse um relatório para enviar ao meu plano de saúde e solicitar o tratamento, depois de um contato telefônico com o médico responsável, Dr. Marcelo.
O neurologista, aparentemente um pouco a contragosto, concordou em fazê-lo, argumentando porém que, estando eu à época internada, não haveria o convênio de negá-lo – no que sinceramente acreditava.
Passou o Natal, o Ano Novo, e nada do relatório.

Meus pais estavam viajando com a Stella para Ipatinga e, assim como vários tios que me deram todo o apoio na ausência deles, a Débora, minha madrinha, vinha me visitar assiduamente. Numa dessas visitas, sugeriu que marcássemos uma consulta com ele, e assim pediríamos novamente o relatório. Liguei para a sua secretária, que me disse que ele iria viajar e que vaga, só para o dia 25 de janeiro; diante da minha observação de que ligaria para ele, me diz: “Tem uma vaga para hoje, às 16:30...”
Nesta terça-feira, pouco antes do horário da consulta, me liga o Paulo Roberto: “Paula, eu estou sem jeito com você, com esta confusão toda, meu pai doente, não tive realmente tempo de fazer seu relatório; mas você vem aqui hoje só para isso? Porque se for, não precisa vir, eu faço o relatório agora, você pede para alguém vir buscar... Veja bem, não me entenda mal, se você quiser vir, estou à disposição, com muito prazer, mas estou querendo te poupar o esforço de pegar a cadeira, um carro, ter que sair de casa, etc...”
Acabou que fui assim mesmo, junto com a Débora e o Maurício, pois não estava me sentindo bem, a quimioterapia que me era administrada já não fazia o efeito desejado, e eu vinha numa piora progressiva desde setembro. Argumentei que até poder tomar o rituximab em fins de janeiro, para quando estava previsto, precisaríamos de uma “forcinha” a mais para agüentar até lá, lançar mão de outra medida.
A consulta foi uma maravilha, mais de uma hora durou, saí de lá com o tão sonhado relatório e uma prescrição do myfortic, como terapia adjuvante. Até o dia 20, no máximo, tomaríamos a nova medicação proposta.
Passamos para a fase seguinte: mando o relatório ao Saúde-Asttter.
Daí a dois ou três dias, não me lembro bem, recebo um telefonema da Solange, relatando que havia um regulamento no plano, número tal tal tal, que não autorizava tratamentos que não tivessem comprovação científica ou que estivessem em fase números tais e tais de aprovação ou experimentação, sei lá...
Bom. Paulo Roberto viajou.
Peço a minha secretária que busque o relatório no Saúde-Asttter e ao Rogério que faça a solicitação do tratamento para a Unimed. Juntamos os dois e o encaminhamos a este novo plano.
Negaram, pelo mesmo motivo. Que mandassem por escrito, a pedido do Rogério. Então pedi ao primeiro convênio que também mandasse por escrito o motivo da negativa.
Durante a viagem, entretanto, o pai do Paulo, que já tinha recebido alta do CTI e estava em casa, volta para o CTI, muito grave. Resultado: o coitado passou três dias tentando vôo de volta pela LAN Chile; em vez de descansar, só mais stress! Minha secretária me diz que só de olhar para ele, estava até “branco”, parecia que nem comia, nem dormia, de tanto cansaço.
Próxima fase: solicitar ao Paulo Roberto o preenchimento de toda aquela papelada exigida pela secretaria de saúde do estado para requerimento de um medicamento, e levantamento de meus documentos. Mais alguns dias de espera, novo relatório, formulários em não sei quantas vias, procuração, reconhecimento de firma, essa coisa toda que vocês já sabem.


Tudo sabendo que iriam indeferir o pedido, já que o rituximab não fazia parte do rol de medicamentos de alto custo disponibilizados pela SES. Apesar de já saberem disso de antemão, para o indeferimento, pedem uma semana. Este sai na sexta à tarde.
Agora, para entrarmos na justiça, com mandado de segurança, seria levar toda a documentação para meus advogados na segunda. Não sei o que faltou, mas isso foi feito na terça, pelo meu pai. Aos advogados do setor jurídico da Asttter, os mesmos que conseguiram para mim todos os outros remédios de que necessitei.
Aí vem procuração para eu assinar. Coisa que fiz chegando de um exame de radiografia, pois estava tossindo muito e com um pouco de secreção. O resultado desta “saída” aventureira foram microfraturas nas vértebras, depois de permanecer pouco tempo sentada; já estava sem forças para manter a coluna ereta.
Daí, vem a dor, ambulância para o pronto atendimento, ortopedia, radiografia, retorno para casa, repouso absoluto, consulta com o especialista em coluna, meu colega de faculdade, o Léo, que fez o imenso favor de me atender em casa e dar todas as orientações possíveis e necessárias.
Porém, depois de uma leve melhora das dores, a fraqueza piorou e tive que começar a tomar banho de leito, pois realmente não conseguia me manter assentada, e vinha com alguns espasmos na musculatura das costas, o que acarretou mais dores e novo telefonema para o Paulo Roberto que, preocupado com a progressão da fraqueza, me pedia para ligar na manhã seguinte; se tivesse piorado, deveria me internar e tentaríamos o rituximab “na marra”, com o juiz de plantão, que sempre tem um no fórum, com relatório de piora progressiva, risco de vida, etc.
No dia seguinte, o Rogério prefere me internar, para tomar uma medicação mais forte para dor, a fim de monitorar a parte respiratória, que podia piorar como efeito colateral desses analgésicos opióides na miastenia (tipo durogesic, um adesivo de fentanil).
Dito e feito. De noite, com o tal adesivo, lá vem depressão respiratória. Bendito Rogério! Chama-se o plantão, tira-se o adesivo; dia seguinte, nova medicação oral. Dipirona, paracetamol, ibuprofeno, tramadol, tudo alternado, até melhorar a dor. E sair a resposta ao mandado de segurança: INDEFERIDO por um desembargador aí...
Ah, meu Deus, e agora?!
A fraqueza piorando, como eu ia voltar para casa assim, até a resposta ao novo mandado de segurança??? Desiste-se do prazo recursal e entra-se com outro processo. Para tanto, o tal desembargador, há que assinar...
Nesse meio tempo, descansa o pai do Paulo Roberto, depois de muito sofrimento, dele e de toda a família...
Enquanto isso, muitos amigos e parentes já se dispunham – e insistiam até – a fazer uma vaquinha para pagar a medicação; mas 32.000 reais???!!
Por fim, decidimos aceitar. Muitos tios, muitos amigos, a igreja se dispôs a ajudar, as meninas começaram a fazer campanha no Felício Rocho, para arrecadar qualquer pouquinho que fosse.
Olhem, independente do resultado, a tocante demonstração de amor e solidariedade, a disponibilidade de tanta gente querida a se desdobrar em afeto e ação valeram mais do que tudo na vida. Que emoção maravilhosa e milagrosa!! Os olhos se enchem de água, o coração de alegria e gratidão eternas. Que Deus os abençoe e lhes retribua em dobro!!

Tomaríamos portanto o rituximab, mesmo sem o deferimento na justiça. Isso foi na quarta. Chegou a noite, e não consegui falar com o Paulo Roberto; o Rogério foi lá, ficou sabendo da decisão, ligou para ele, mas também não conseguiu localizá-lo.
Quinta de manhã, ligo para ele lá pelas 10:00 ou 11:00, relato a decisão, e mais tarde, por volta das 18:00, chega ao apartamento argumentando que “não seria melhor voltar para casa, esperar o carnaval, mais uma semana, visto que já havia esperado tanto tempo, até que a justiça decidisse novamente?...”
Nada disso: “Pode fazer a prescrição”.
Ficou de vir no dia seguinte cedinho, para prescrever.
Sexta de manhã, e nada do Paulo; por fim, fiquei sabendo que ele já havia preenchido a prescrição, porém, no formulário errado – tinha que ser o da quimioterapia!!
Chega-me na tarde de sexta feira, transtornado, dizendo que eu morreria de raiva, mas que não havia a medicação no hospital!!!!! Teria que pedir para comprarem, mas com o carnaval, só na próxima sexta...
Só pude fazer: rir!! “Só pode estar brincando!!”
Enfim, tinha UM frasco reservado para outro paciente, da oncologia, mas ninguém sabia que dia ele ia tomar...
Procura-se o coordenador da farmácia do hospital – já tinha saído, para o carnaval. Liga-se para a diretora do Felício Rocho, muito amiga, e o anjo da minha vida; mas aparentemente, ela também já havia saído. O Jefferson, entretanto, seu secretário, estava lá, e mamãe liga pra ele, pede para localizar o Marconi, aquele coordenador. Uma telefonação, ninguém imagina!! Em vinte minutos, aconteceu de tudo!! Raiva, agitação, ansiedade, pressa, papai e mamãe buscando a Stella na escola, minha mãe sem o celular, só o do meu pai, e não sabia informar o número para o Jefferson, que afinal ia me ligar diretamente no quarto para dar um retorno.
Ninguém mais do que a própria Alda, diretora do HFR, me liga então, dizendo que já tinha resolvido tudo, que eu ficasse tranqüila, que no sábado tomaria o remédio pela manhã...
Enquanto isso, ligo para o Paulo, confirmando, e o telefone toca no quarto, era do jurídico da Asttter, procurando meu pai com urgência, que estavam com a liminar na mão, autorizando a medicação, e que ele deveria pegar lá até as 18:00, ou seja, daí a 10 minutos.
E o telefone fora de área, cai na caixa postal, dá ocupado, ligo pro da mamãe, o Maurício é que atende na casa dela, e ela no carro, com o papai e as meninas... Ah, meu Deus!!!
Por fim, consigo falar no tal celular, papai busca a liminar, leva à SES, que já está fechada!!!
Enfim, foi autorizado pelo juiz de plantão do fórum, que foi abordado pela estagiária do jurídico da Asttter, já dentro do elevador, com a pastinha debaixo do braço, saindo também para o carnaval.
Isso depois de serem avisadas, minha advogada e a estagiária, que ele costumava negar medicamentos, em geral... Mas decidiram tentar com ele mesmo, assim mesmo!... E assim foi: sei que nos relatórios constava que eu estava internada, um do Paulo Roberto, outro do Rogério, e sei lá se ele ficou com medo de eu piorar, e lá vinha uma semana de carnaval, voltou ao seu escritório e autorizou o danado do remédio!!
Com isso tudo, no sábado tomei a primeira dose, durante a qual estavam presentes o Paulo, a enfermeira chefe e a técnica da quimioterapia, todos de olho para alguma possível reação – o que, graças ao bom Deus, não ocorreu.

No dia seguinte, olha eu sentada na sala, durante mais de quatro horas, comemorando com todo mundo!!! Na segunda, voltei a tomar banho de chuveiro e tudo o mais.
Ontem tomei a segunda dose e recebi alta hoje. As duas, financiadas pela generosidade incalculável daqueles que amamos e que nos amam.
Para a próxima semana, esperamos contar já com os frascos da secretaria de saúde, que hão de sair até na terça feira, se tudo correr bem.
Bom, chega de novela, né?!
Para a sexta, estão programadas as duas doses de uma só vez, já que o hemograma está bom e não tive reações ao tal rituximab.
Que tudo corra bem, depois desta demonstração das mãos de Deus atuando de forma cronometrada e surpreendente em cada pequeno detalhe, e nos mostrando que o que vale na vida, acima de tudo, é o AMOR e nada mais – com todos os desdobramentos por que pode se traduzir.
E que a união realmente faz a FORÇA, literalmente!!

Paulinha.
20/02/10

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