domingo, 14 de junho de 2020

Mani Catão, Carlos Drummond, minha mãe e eu em mais que um dia ensolarado na Cidade Maravilhosa





Quem é da minha geração, e principalmente da geração de meus pais, provavelmente conheceu ou já ouviu falar de Mani Catão.
Mani fora jornalista no Rio de Janeiro,  a arte corria em suas veias; veio parar em Belo Horizonte, aparentemente após uma separação. 
Quando minha mãe a conheceu, ela já arrumava noivas para a cerimônia. Maquiagem, arranjos e afins.  Pessoa exótica. Muito. Sempre vestida com seu sari indiano. O arranjo em que colocasse as mãos modificava-se inteiramente, ganhava vida, movimento. Maquiagens suaves, muito bem feitas. Sofria de asma e se tratava com meu avô, João Frazão de Castro, que era clínico geral. Tornou-se amiga da família. Foi ela quem maquiou, fez os arranjos de bouquet e outros detalhes para minha irmã, quando se casou aos 21 anos de idade; de quebra, foi sua madrinha de casamento. Foi ela quem maquiou e arrumou minha mãe e minhas tias Débora e Maria Eunice para o dia do casório. O que poucos devem saber é que ela e Carlos Drummond de Andrade eram amigos.
Pois bem. 
Podia eu contar com meus 19 ou 20 anos, acabara de ser aprovada para o curso de Medicina, no vestibular da UFMG. Minha mãe e eu fomos ao Rio, passar uns dias para comemoração. Mani nos fez portadoras de um doce que o poeta muito apreciava - uma compota de bolinhas de queijo, provinda de Araxá. Com endereço em punho,  lá fomos nós, cumprir a missão.
Como poderia deixar de levar um livro dele, para que o autografasse? Comprado. Feito.
Acionamos o interfone, ao que fomos atendidas por quem parecia ser a esposa do escritor, que muito secamente nos informou que ele não se encontrava no momento e que poderíamos deixar a encomenda com o porteiro. Este, gentil, educado, solícito, previu, pelos hábitos do condômino, que  provavelmente voltaria de sua caminhada em cerca de 5 minutos. Felizmente, aguardamos no hall do condomínio, ao que fomos recompensadas e agraciadas com a presença simples e mineira, acolhedora, de Carlos Drummond de Andrade, em pessoa! Pele muito branquinha, quase transparente, chegara de sua rápida caminhada vespertina, a fim de tomar um pouquinho de sol e exercitar as pernas.
Entregue a encomenda, recados dados, agradecimentos, recomendações. Perguntou-me o que eu fazia, ao que, do alto de meu nariz empinado, respondi: “sou estudante de Medicina!”. Sequer havia iniciado o curso. Fez-me uma dedicatória, autografou.
Pronto. Para sempre será lembrado, como se já não o fosse.  Alguém que já era imortal.
O livro se denomina “Os dias lindos”, e a dedicatória, deixo a foto para saborearem.
Tão mineiro!
Como tanta criação e sensibilidade poderiam caber dentro daquela figurinha mignon, simples, de fala mansa e empática? Ali residia o mundo.
O presente foi de Mani para Drummond, entretanto, quem saiu mesmo no lucro fomos nós, reles mortais. Obrigada, Mani Catão!
“Somos... O resultado dos livros que lemos, dos cafés que desfrutamos, das viagens que fazemos e das pessoas que amamos.” (desconheço autoria).
José Raimundo, mais detalhes para se somarem à sua crônica! Espero que goste!

Paula Mendes
14/06/2020




2 comentários:

  1. Acabei de me lembrar, pelo seu texto, que foi a Mani Catão quem desenhou meu vestido de 15 anos cuja festa não tenho nenhum registro porque o fotógrafo não apareceu.
    Cheguei a conhecê -la. Ela vestia roupas bem coloridas? Estou certa? Rejane

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Se me perguntarem quem sou, talvez eu me demore na resposta. Não por não saber, mas porque carrego em mim tantas versões de mim mesmo. Sou o...