quarta-feira, 24 de setembro de 2025

COMPREENSÃO X IGNORÂNCIA

Todos lidamos na vida com a compreensão e com a incompreensão alheia, faz parte; assim como com a ignorância, em ambos os sentidos: o da falta de educação e estupidez, mas também o da falta de conhecimento sobre determinado assunto.
Tudo isso é intrínseco à convivência.
Hoje quero falar sobre estes temas dentro de um tópico específico, o da miastenia gravis.
Pouco depois que adoeci, há 22 anos, passei a participar de um grupo do Orkut, dedicado a miastênicos em geral. Anos depois, passei para um grupo do Facebook, em seguida mais alguns outros do próprio Facebook e chegamos a formar o grupo das ‘mosqueteiras’, composto por 5 amigas - ou miastênicas, ou esposas de portadores de miastenia.
Hoje já não faço parte desses grupos, mas aprendi muito com eles e trocamos muitas e ricas experiências.
Com essa convivência virtual – e algumas vezes até presencial – pudemos compartilhar muitas vivências, diversas delas, comuns à maioria de nós.
Cheguei a perder alguns amigos para a doença.
Um relato frequente dos participantes dos grupos era a incompreensão da família e círculo de amizades, quando queixavam de um ‘cansaço’ que não entendiam muito bem:
- Você está cansado de quê, menino, você não fez nada!
Ou então, eram tidos como preguiçosos.
Tudo gerado por uma falta de conhecimento dos sintomas e da essência dessa enfermidade. Até que se explique...(!)
Já perdi amigos que 'passaram desta para melhor' por falta de conhecimento e ignorância – em ambos os sentidos – da equipe de saúde, infelizmente. Verdade seja dita.
Trata-se a miastenia gravis de uma doença rara, com prevalência de 150 a 200 casos para cada milhão de habitantes. 
É uma doença autoimune e neuromuscular, que provoca fraqueza generalizada em todos os músculos, inclusive dos olhos, da mastigação, da deglutição, da respiração e dos membros. Há tratamento, mas não a cura. 
Algumas pessoas conseguem levar uma vida praticamente normal, outras já apresentam um quadro mais grave. Tudo muito variável, inclusive em épocas diferentes da vida de uma mesma pessoa.
Por ser uma doença rara, entre os profissionais de saúde, não se lida muito com ela e não se a estuda com frequência. Talvez por uma menção rápida na escola, uma pincelada para se ter noção do que se trata.
No entanto, trata-se de uma afecção  melindrosa, pois que os sintomas não são aparentes, além dela ser incompatível com inúmeros tipos de medicamentos, prescritos inadvertidamente nos atendimentos de saúde espalhados pelo mundo.
Neste caso, faz-se necessário que o próprio paciente saiba quais medicamentos devem ser evitados, o que nem sempre é possível.
Sofro de fraqueza generalizada, inclusive respiratória. É um problema muscular e não pulmonar, o que não costumam entender.
Entre idas e vindas ao PA (pronto atendimento), ao CTI e à internação em apartamentos no hospital, tenho lidado repetidamente com os mesmos argumentos e comentários:
- Sua saturação está boa, sua frequência respiratória está boa, não tem indicação de internação, muito menos de CTI.
Até que se explique que o problema é muscular e que se converse com meus médicos, que referem um risco de falência muscular, já passamos por muito estresse, eu e minhas acompanhantes, inclusive bullying na própria instituição de saúde. 
Sempre a mesmíssima coisa. 
Algumas vezes mais compreendida, outras, de jeito nenhum, a ponto de recusarem atendimento na sala de urgência e me ignorarem completamente.
Este é um desabafo e um alerta.
Penso nas pessoas portadoras de outras moléstias raras, nas dificuldades e obstáculos que são obrigados a transpor.
Viver não é fácil para nenhum de nós, cada um tem o seu pedaço e tem que vivê-lo individualmente. Mesmo com o apoio alheio, cada um tem que atravessar o que o destino lhe oferece.
No meu caso, tenho toda uma rede de apoio e sou imensamente grata, eternamente grata por isto. 
Mas nem sempre é assim.
Meu desejo é de que abramos o leque e a mente  para a aquisição de conhecimentos e empatia  para todos os tipos de pessoas incompreendidas, não apenas aquelas doentes; que possamos ouvir, nos colocar no lugar delas, procuremos estudos, dados, conhecimento de causa, sem julgamentos prévios.
Ninguém sabe o que o outro passa na intimidade, a não ser com uma convivência muito próxima.
A compreensão, a meu ver, vem com o oposto da ignorância, em ambos os sentidos.
Que façamos o nosso melhor e que, de algum modo, este desabafo sirva como conscientização para quem o ler e quiser passá-lo adiante.
Boa tarde!

Paula Mendes
10/08/2025

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